Desde seu primeiro suspiro...
Quando retirado violentamente, do ambiente escuro...
Onde havias se escondido durante tempos...
Chorando assustado ao encontro de um mundo novo...
Apartado...
Em fim sozinho...
Desprendido e entregue a mim...
Submetido a mim...
Eu já estava lá!...
Quando em seus primeiros passos...
Caías e choravas...
Machucava-te e saravas...
Eu estava lá...
Quieta ao canto...
Somente a te observar...
Em seu primeiro dia...
Indo só a própria sorte...
Atravessando ruas...
Interagindo com estranhos...
Despejando sorrisos e bom dias...
Comprando o pão e guardando o troco...
Sem perceber...
Você passou por mim...
Já na escola...
Durante os exercícios e brincadeiras...
O lanche e a dedicação...
Embora sendo simpática a seu esforço...
Não podia desviar de ti o olhar...
Era mais forte que eu...
Não cabia a mim decidir...
Portanto...
Quando ao fim das aulas...
Caminhavas para casa, contente e saudoso dos seus...
Louco para ver TV, soltar pipa e brincar com seu cãozinho...
Tinha que acompanhá-lo!
Na adolescência...
Tive que ser indiscreta...
Acompanhei de perto seu primeiro beijo...
Observei suas reações, vi que tinha muito ainda à aprender....
Participei de suas festas...
Bebi com você...
Embora estivesse a serviço...
Tive vontade de esmurrar quem mexeu contigo...
Entretanto...
Me ative a apenas acompanhar seus movimentos!
Adentrando a vida adulta...
Quando procuravas achar o teu caminho...
Descobrir quem de fato eras...
Desiludindo-se e recusando-se a desistir...
Orgulhei-me de ti...
Tentei entrar na sua frente...
Quando vi que portas bateriam em sua cara...
Mas...
Me foi recusada essa satisfação...
Me obrigaram a ficar somente à espreita...
Esperando o tempo e a oportunidade...
A qual eu rezava que estivesse distante...
Em sua velhice...
As crianças brincando ao seu redor...
Pedindo colo...
Querendo histórias e biscoitos...
Os almoços de domingo...
As preces de fim de tarde...
Estive sempre ao seu lado...
Quando antes de se deitar, olhavas para a estante cheia de fotos...
Pedindo à Deus que guardasse a família ...
Até que um dia...
Pude então te tocar...
Após encerrada a seção...
De uma história muito bem contada e bem vivida...
Numa noite bonita e calma...
Beijei-te a face...
Acariciei delicadamente os seus cabelos brancos, até que pegasse no sono...
Seguindo o ritmo tranquilo do embalo doce de uma vida plena...
Dormiste em paz.
Tenho agora que dizer que fui feliz!
Sei que não era este meu papel em sua narrativa...
Mas não tinha como evitar...
A moral me obriga a admitir...
Eu fui feliz!...
Apenas em te observar...
Minha função era te aguardar...
Te arrebatar...
No entanto...
Sinto que de algum modo...
Acabei por te proteger e resguardar...
Quando perigos lhe rondavam!
Se tivesse eu um coração...
Se ao menos tivesse peito...
Uma caixa torácica mesmo que vazia...
Me arriscaria a dizer...
Que cheguei mesmo...
A te amar!
Simone Tavares
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