O relógio, a âncora e a ponte.

Andei percebendo que as horas, dias e anos andaram passando muito depressa...

Embora, o tempo se arraste para mim...

Percebi que tenho perdido a hora...
Atrasado as refeições...os dias das matrículas...as reuniões...adiado decisões...
Não dado a devida atenção para aqueles que me amam e contam comigo.

Achei que a solução seria comprar um relógio...
Um relógio de pulso grande, porém, delicado.
Que este me serviria de âncora para que eu parasse de me deixar levar pelas ondas de meus devaneios, divagações e contemplações...
Que me ajudaria a parar de me perder no tempo...
Que me serviria como ponte à realidade!


Desisti da idéia ao notar o custo que isso me traria!


O relógio que eu necessitava...
Era muito especial, caro, raro...e bem acima de minhas condições...

Condições de atravessar esta ponte...

De deixar de ser quem sou...
De perder o prazer de me perder de vez enquando!

Percebi que ainda não estou apta a carregar e transitar pela vida, com tão imponente artefato...
Cuja responsabilidade no manuseio e manutenção, ainda não me é devida...
Para o qual...
Ainda não estou preparada!

Atentei também ao fato...
De que esta âncora acabaria por me fazer naufragar...pois há momentos, em que lutar contra a maré e ir de encontro as ondas...
É o que de pior podemos fazer!
Que isso poderia acabar precipitando situações ainda mais tenebrosas...
E me atirando ao precipício de um colapso que poderia me tornar catatônica...
Mergulhada em uma apatia irreversível.

Decidi aceitar então... o fato de que cada um é como é...

De que nosso relógio biológico e espiritual, não pode ser acertado por qualquer maquinário que seja...

Que o tempo se faz conforme ele vai passando, vai se acertando e se adequando as nossas necessidades conforme estas vão nos apresentando...

Ir dormir de madrugada ...
Dizer "eu te amo" quando bem me dá vontade...
Sair do banho as pressas procurando um caderno para escrever...
Esquecer um arroz no fogo e depois ter que raspar por cima, para o gosto de queimado ninguém perceber...
Exagerar um pouco no volume do som...
Me arrumar em cima da hora...
Sofrer por pouca coisa...
Rir de algumas desgraças...
Ver o lado bom das coisas ruins...
O negativo dentro do "aparentemente" positivo...
Desconfiar das esmolas...
Agradecer por algumas derrotas...

Nada disso é tão ruim assim!

Observei...

Que não importa a hora que acordo, contanto que cumpra meu destino e o faça da melhor maneira possível...

Que não importa o que digam...afinal, quem gosta de reclamar e criticar sempre encontra algo a apontar, não fazendo diferença qual seja nossa conduta ou empenho em lhes fazer as vontades...

Que não importa tentar se resguardar da dor...pois se esta estiver a nossa espreita, por mais que tenhamos cautela, ela sempre vai nos agarrar e sufocar...

Que não importa a falta de fé na felicidade...por mais que relutemos e desconfiemos de seu intuito...se esta for de nosso destino...sempre irá nos encontrar...afagar com carinho e nos dar abraço forte e acolhedor!


Decidi...

Que se eu tiver que me afogar, ao menos será no meu próprio mar...
Um mar azul meio esverdeado...
Cristalino, por sobre o qual só eu posso enxergar minhas belas criaturas e criações...

Bem diferente das águas turvas nas quais a maioria que me cerca esta ancorada!

Que se um dia eu resolver formar uma ponte e atravessá-la...

Certamente esta não me levará a realidade tosca na qual muitos acreditam...
Me levará segura a outro mundo...
Um mundo que pode ainda não ser perfeito...mas que não é circundado pela névoa que cerca os demais...
Onde a terra é muito mais fértil e firme...

Bem diferente do lamaçal onde os que conheço estão atolados até o pescoço!

Se um dia optar por de fato ancorar em algum lugar...
Não será aqui...
Muito menos agora!

Apenas uma coisa é certa:

 

Espero que você me acompanhe!

Simone Tavares